Relação Terapêutica e Psicopatologia.

*Álvaro Augusto dos Santos Carvalho
RESUMO
Este trabalho têm a intenção de descrever, compreender e explicar a abordagem terapêutica existente no filme “O Bom Rebelde” de Gus Van Sant de 2000 e a possível Patologia presente, no âmbito da Psicopatologia. Neste contexto foram utilizados métodos e instrumentos clínicos de diagnóstico bem como modelos de intervenção terapêutica e teórias explicativas do fenómeno “Como funciona a relação terapêutica e a sua importância”. Foram levantadas hipóteses para o diagnóstico diferencial do Eixo II e IV do DSM-IV e do Eixo V, para Avaliação Global do Funcionamento-GAF. Foram também seleccionados trechos visuais e discursos utilizados no filme para melhor elucidar os objectivos e o caminho percorrido para a elaboração do trabalho.

Palavras-Chave: DSM, Perturbação Anti-Social, Psicoterapia, Psicopatologia, Relação Terapêutica.


ABSTRACT
This study intended to describe, understand and explain the therapeutic approach exists in the movie "Good Will Hunting" by Gus Van Sant in 2000 and the possible pathology present in Psychopathology. In this context we used methods and instruments for clinical diagnosis and therapeutic intervention models and theories that explain the phenomenon "How does the therapeutic relationship work and its importance." Hypotheses have been raised for the differential diagnosis of Axis II and IV of the DSM-IV and Axis V for Global Assessment of Functioning, GAF. We also selected the visual and speeches used in the film to better clarify the objectives and the path taken for the preparation of the work.

Keywords: Antisocial Personality Disorder; DSM, Psychotherapy, Psychopathology, Relationship Therapy.

O objectivo do trabalho centrou-se em perceber a eficácia da relação terapêutica no indivíduo em observação, levantar hipóteses com uso de métodos de avaliação e de diagnóstico padronizados medindo o comportamento e caracterizando-o no contexto da Psicopatologia. Foi concretizado por uma apresentação oral e escrita tendo como base a visualização do filme “O bom rebelde” de Gus Van Sant de 2000.
No decorrer do trabalho descrevem-se as fases do processo de investigação, a formulação do problema, a elaboração da hipótese, as teorias explicativas do fenómeno em estudo, a metodologia utilizada para a observação do comportamento e o processo de avaliação e diagnóstico.
A revisão da bibliografia foi particurlarmente importante para se definir e melhor enquadrar o referencial teórico para a investigação em causa e permitir seleccionar os instrumentos para a recolha de dados.
Foram utilizados métodos e instrumentos clínicos de diagnóstico bem como modelos de intervenção terapêutica e teórias explicativas do fenómeno “Como funciona a relação terapêutica e a sua importância”. Levantaram-se hipóteses para o diagnóstico diferencial do Eixo II do DSM-IV, Perturbação Anti-Social da Personalidade e Perturbação Estado-Limite da Personalidade (Bordeline).  Através do Eixo IV indicam-se os Problemas Psicossociais e Ambientais que podem influenciar o diagnóstico. Fez-se uso do Eixo V, para utilização da Escala de Avaliação Global do Funcionamento (GAF).
As terapias biológicas, particularmente, a medicação constituem uma das principais formas de tratamento das perturbações mentais: A Psicoterapia é também uma abordagem útil e faz uso de meios psicológicos (Gleitman, 2007). São diversas as abordagens para tratamento dos pacientes. Em quase todas encontramos uma peça fundamental do seu funcionamento, a relação terapêutica.
A Psicopatologia é a ciência e o estudo dos sintomas psicológicos e psiquiátricos (Fish, 2007). O estudo das perturbações da personalidade tem vindo desde a antiguidade até aos nossos dias a afinar métodos e instrumentos de avaliação e de diagnóstico, sendo o Manual de Diagnóstico e Estatístico de Transtornos Mentais (DSM-IV-TR, 2002) o que tem vindo a afirmar-se em contextos clínicos, distingue e classifica as perturbações e distúrbios em eixos diferentes.
Com um “olhar” clínico sobre a relação terapêutica existente no filme e fazendo a ponte entre um diagnóstico e a psicopatologia, tentou-se perceber e explicar como é o comportamento do caso clínico (Will) e em que categoria o podemos quantificar. A observação foi realizada através da visualização do filme.
Os participantes no trabalho ainda não estão qualificados a fazerem diagnósticos clínicos na área de psicologia, mas uma vez que o presente trabalho se enquadra na cadeira de psicopatologia do curso de psicologia, entenderam por bem fazer uso dos conhecimentos adquiridos ao longo do semestre e puseram-no em prática.
Os métodos clínicos utilizados foram os apresentados e explorados na cadeira de psicopatologia, visando os objectivos da licenciatura em psicologia. Objectivando reduzir a subjectividade da avaliação foi utilizado como referencial de diagnóstico, para levantamento de hipóteses, o DSM-IV-TR e elaborada uma anamnese, com a informação possível, comportamentos observados e os dados que a história do filme faculta. Contou-se com os discentes participantes no trabalho para orientação e elaboração do diagnóstico
O método de observação utilizado foi não participante. Os métodos de diagnósticos utilizados foram os do DSM-IV-TR para o diagnóstico diferencial e definitivo. As perturbações enquadram-se no Eixo II, 301.7 Perturbação Anti-Social da Personalidade [F60.2] e 301.83 Perturbação Estado-Limite da Personalidade [F60.31] (Bordeline). Foi também avaliado o Eixo IV Problemas Psicossociais e Ambientais como indicador das possíveis causas na origem da problemática. Problemas com o grupo de apoio primário. Problemas relacionados com o ambiente social. Problemas relacionados com a interacção com o sistema legal/crime. Para aperfeiçoamento do diagnóstico diferencial recorreu-se ao SCID-II, entrevista clínica estruturada para os distúrbios de personalidade e a observação do comportamento do caso clínico observado no filme.
Para descrever o contexto em que o trabalho foi elaborado foram seleccionados trechos visuais e discursos utilizados entre os personagens para melhor elucidar o caminho percorrido para a elaboração do presente trabalho. Oportunamente foram apresentados oralmente (Anexo IV, V).
A problemática envolta das abordagens, levanta as seguintes questões: Qual a mais eficaz? Qual é a que vai ao encontrar do paciente? Como é que ele se estrutura nesse encontro? Como se torna ele próprio com sentido de vida? Todas estas questões encontram uma resposta comum e central, a relação terapêutica. A relação terapêutica parece ser uma peça fundamental em todo o processo para se efectivar o processo de motivação que leva a mudança em que o terapeuta desempenha um papel activo.



DESENVOLVIMENTO
A Psicopatologia é a ciência e o estudo dos sintomas psicológicos e psiquiátricos (cit. in FISH, Psicopatologia Clínica; 2007), por vezes também designado por psicologia da anormalidade, que tem em linha de conta vários aspectos do comportamento e que regra geral causam angústia e afectam o funcionamento da pessoa
Segundo Scharfetter (2005), normal ou patológico, pode considerar diferentes critérios para definir uma e outra situação. Assim, seguindo o critério estatístico, o normal é o que está de acordo com a norma e o patológico são os fenómenos que não estão de acordo com as normas do funcionamento psicológico. Normal é o comportamento adequado pela maioria das pessoas de um determinado sexo, grupo etário, por comportamentos adoptados por um determinado grupo sócio-cultural. Normal é sobretudo o que é comum em determinados aspectos do comportamento. O normal segundo este critério varia consoante as várias culturas, os vários grupos sociais, religiões e os diversos contextos. O comportamento de uma pessoa é determinado pelo contexto social, desta forma o espaço social determina a normalidade/anormalidade. Anormal não significa patologia. Muito do que é considerado anormal não tem nada haver com patologia. É possível ser anormal e ter uma vida saudável.
O critério sofrimento é essencial para a determinação de normal e patológico. Se determinado funcionamento psicológico provoca sofrimento ao próprio ou terceiros então estamos perante uma patologia, caso contrário será normal.
O critério capacidade de mudança, determina que normal é ser capaz de mudar e patológico significa incapacidade de mudar quer a nível do comportamento quer a nível psicológico.
Doente, segundo (Scharfetter, 2005), é a pessoa que sofre qualitativamente ou quantitativamente mais do que uma pessoa saudável, quem apresentas muitas diferenças e que por esse motivo não consegue estabelecer uma relação activa com os outros. Um doente apresenta um comportamento com as seguintes características: queixas, sentimento de medo, insegurança, dependência, necessidade de apoio, de tratamentos.
Saudável é uma pessoa que atinge a sua auto-reliazação independentemente da pressão exercida por um a doença e/ou contra a pressão exercida pelo que é normal numa sociedade. Trata-se de uma pessoa capaz de desenvolver e adaptar-se às suas tarefas afirmando-se na sociedade.
Os sintomas psicopatológicos são modos de vivência e de comportamento que se destacam do ambiente habitual. Nenhum sintoma psicopatológico isolado é sem outra razão anormal ou doentio, uma vez que todos estes sinais se podem encontrar em pessoas saudáveis.
            Assim para Scharfetter (2005), o sintoma é a mais pequena unidade de observação em psiquiatria. Os quadros clínicos que se repetem com uma constelação de sintomas que aparecem frequentemente relacionados uns com os outros são chamados de síndrome.
“ Uma síndrome é assim uma combinação típica de um conjunto de sintomas (que não tem de ser, também, forçosamente causal.)” (Scharfetter, 2005:46)
Segundo a definição do DSM-IV as perturbações podem ser definidas da seguinte forma:
 “… Cada uma das perturbações mentais é conceptualizada como uma síndrome ou padrão comportamental ou psicológico clinicamente significativo que se manifesta numa pessoa e que está associado a um mal estar actual (sintoma doloroso) ou incapacidade (impedimento de funcionar em uma ou mais áreas importantes) ou ainda com um aumento significativo do risco de se verificar morte, dor, debilitação ou uma perda importante de liberdade”(Gleitman, 2007:p107)

Segundo Scharfetter (2005), o diagnóstico consiste num conhecimento sistemático sustentado em diversas informações que possibilita a tomada de decisão face à necessidade de intervenção. O diagnóstico é baseado no exame clínico, no estado do doente (psicopatológico ou somático), na anamnese que por sua vez leva ao processo de diagnóstico diferencial tendo como resultado o diagnóstico final.
Assim, o diagnóstico tem como finalidade fornecer orientação para o tratamento e para a profilaxia adequada. A realização de um diagnostico incorrecto conduz a uma terapêutica inadequada face á situação do sujeito.
Diagnóstico – (DSM)
          A classificação dos transtornos mentais melhorou muito na última década do século XX e agora fornece uma ferramenta confiável e operacional. Uma maneira comum de definir, descrever, identificar e classificar encontra-se nas publicações do (CID) Classificação Estatística Internacional de Doenças -transtornos mentais e do comportamento, e no (DSM) Manual Diagnóstico e Estatístico de Transtornos Mentais. Estas classificações têm facilitado a prática, ensino e pesquisa, proporcionando um melhor delineamento das síndromes. (Cit. in Psychiatric Diagnosis and Classification, 2002 pág. 25)
           A predilecção natural de categorizar e, consequentemente, para compreender a doença mental remonta a pelo menos 3000 aC, com a descrição de uma demência senil em Prince Ptahhotep, seguido por terminologias diferentes e abordagens de classificação que foram propostos por filósofos e médicos ao longo da história. (cit. in Psychiatric Diagnosis and Classification, 2002 pág. 48).
          Um diagnóstico pode referir-se a uma síndrome consistente cuja causa é desconhecida ou variada, um transtorno específico de estrutura ou função, cuja causa permanece desconhecida, um desvio de uma norma específica fisiológica, ou os efeitos de um determinado agente etiológico ou processo (cit. in Kaplan & Sadock's, 2000).
             As doenças psiquiátricas foram amplamente reconhecidas no mundo antigo. A melancolia e a histeria foram identificadas no Egipto e na Suméria por volta de 2600 aC. Na Índia, uma nosologia psiquiátrica foi reconhecida dentro do sistema de classificação médica da Ayur-Veda, escrito cerca de 1400 aC. Hipócrates e Platão criaram sistemas para classificar os transtornos mentais na Grécia clássica. O sistema de Hipócrates foi baseado principalmente na observação empírica. O sistema platónico foi filosoficamente enraizado no idealismo racional. No entanto, esta distinção entre empirismo e racionalismo não é absoluta. O Sistema de Hipócrates incluía uma teoria humoral de temperamento que poderia ser considerada idealista. O sistema de pensamento racional de Platão foi parcialmente destinado a explicar a realidade observada. Na Roma clássica as classificações basearam-se principalmente no sistema de Hipócrates. O Galénico sistema humoral persistiu até a Idade Média na Europa (cit. in Kaplan & Sadock's, 2000).
          A tensão entre os paradigmas com base na observação e as teorias continuaram no século XIX. No início do século XX, não existe reconhecimento universalmente de diagnóstico psiquiátrico. Diferentes métodos regem as escolas na Europa e nos Estados Unidos, criando confusão e problemas de credibilidade. Nos Estados Unidos o impulso inicial para o desenvolvimento de uma classificação dos transtornos mentais foi a necessidade de recolher informações estatísticas para os censos. Nos censos de 1880, sete categorias de doença mental foram distinguidos: mania, melancolia, monomania, paralisia, demência, alcoolismo e epilepsia. O papel crescente do governo na área da saúde criou uma maior tendência para a necessidade de uniformidade do diagnóstico. O primeiro padrão de nosologia psiquiátrica foi produzido nos E.U.A. em 1918 pela American Medico-Psychological Association (precursora da American Psychiatric Association [APA]) e da Comissão Nacional de Higiene Mental (cit. in Kaplan & Sadock's, 2000). Consistia em 22 doenças e era para ser utilizado, principalmente, para a recolha de dados estatísticos. Esta recolha era assim uniformizada em todas as instituições para doentes mentais. Estava destinado a ser revisto a cada 5 anos. Em 1935, a APA colaborou com o New York Academy of Medicine para o desenvolvimento de uma nomenclatura psiquiátrica nacionalmente aceitável e a ser incorporada na “American Medical Association's (AMA's) Standard Classified Nomenclature of Disease.” (cit. in Kaplan & Sadock's, 2000).
         Devido ao sistema AMA continuar focado na doença mental grave, a sexta revisão do Manual de Classificação Estatística Internacional de Doenças, Lesões e Causas de Morte (CID-6), foi desenvolvido em 1948 pela Organização Mundial da Saúde (OMS), e não era inteiramente satisfatório para os psiquiatras americanos, de modo a que a APA desenvolveu uma variante que foi publicada em 1952 como a primeira edição do DSM (DSM-I). Fortemente influenciado pela visão psicobiológica de Adolf de Meyer que assentava no ponto de vista da reacção, este foi o primeiro manual oficial dos transtornos mentais a centrar-se sobre a utilidade clínica para a classificação. Seguiu-se o DSM-II em 1968 que não trouxe alterações substanciais, a não ser a eliminação do termo de relação a partir dos diagnósticos (cit. in Kaplan & Sadock's, 2000).
          Tal como aconteceu com o DSM-I e II, o desenvolvimento do DSM-III foi coordenado com o desenvolvimento da nona revisão da Classificação Internacional de Doenças (CID-9) e publicado em 1980 pela APA. É um regresso a um
sistema descritivo do diagnóstico, com base em critérios diagnósticos explícitos,
teoricamente neutro, e multiaxial em formato. A terceira edição revisada do DSM
(DSM-III-R, 1987) e DSM-IV de 1994 refinou as categorias de diagnóstico baseado em dados empíricos, e começou a fazer o sistema actual de diagnóstico compatível com a actual revisão do CID 10 Classificação Estatística Internacional de Doenças e Problemas Relacionados à Saúde (Kaplan & Sadock's, 2000).
 Diagnostic and Statistical Manual of Mental Disorders - Fourth Edition (Manual Diagnóstico e Estatístico de Doenças Mentais - Quarta Edição), publicado pela Associação Psiquiátrica Americana (APA) em Washington em (1994), é a quarta edição do DSM e é a principal referência de diagnóstico para os profissionais de saúde de Portugal na prática clínica. O DSM-IV usa um sistema categórico. As categorias são protótipos, e um paciente com uma estreita aproximação com o protótipo é classificado como possuidor da doença. Para aproximadamente metade dos transtornos, é preciso que os sintomas causem significantes transtornos ou prejuízos nas áreas sociais, ocupacionais ou outra área importante de funcionamento (DSM-IV-TR, 2002).
       O DSM é um manual de diagnóstico e estatística de doenças mentais. Serve para ajudar no diagnóstico médico. No caso do DSM-IV-TR está organizado de forma a dividir as perturbações mentais em tipos, com base num conjunto de critérios com características definidoras. No entanto, não havendo dois sujeitos iguais o terapeuta ao fazer determinado diagnóstico a um conjunto de indivíduos com a mesma perturbação leva em consideração a heterogeneidade dos mesmos, ou seja, embora o diagnóstico seja o mesmo o caminho para lá chegar foi diferente de sujeito para sujeito.
       As perturbações são classificadas segundo um sistema de códigos e categorias, tendo como ponto de partida os Eixos I - Perturbações clínicas e Outras situações clínicas que podem ser foco de Atenção médica, Eixo II - Perturbações da personalidade e Deficiência mental e Eixo III - Estados físicos gerais. O Eixo IV, Problemas psicossociais e ambientais. O Eixo V, Escala de avaliação global do funcionamento. (Anexos I e II)
Perturbações da Personalidade
A perturbação da personalidade é um padrão estável de experiência interna e comportamento. Manifesta-se pelo comportamento desajustado do sujeito em relação ao meio onde está inserido. É global e inflexível, em início na adolescência ou no início da idade adulta, é estável ao longo do tempo e origina sofrimento ou incapacidade. As perturbações da personalidade são classificadas no DSM-IV-TR no Eixo II (DSM-IV-TR, 2002)
Perturbação anti-social da personalidade
“A perturbação anti-social da personalidade caracteriza-se por um padrão global de comportamento que revela menosprezo e violação dos direitos dos outros, tem início na infância ou adolescência precoce e continua na idade adulta. Este padrão pode também ser designado de psicopatia, sociopatia ou perturbação dissocial da personalidade” (DSM-IV-TR, 2002).
As características centrais da perturbação anti-social da personalidade, são a fraude e a manipulação. No entanto tem uma série de outras características associadas. Por exemplo, as pessoas com perturbação anti-social da personalidade frequentemente apresentam sinais de ausência de empatia, cinismo, desprezo pelos sentimentos, direitos e sofrimento dos outros. Estas pessoas podem ter uma auto-estima elevada ou arrogante, serem intensamente opinativas, autoconvencidas e pretensiosas. Podem demonstrar um certo encanto superficial e aligeirado, serem volúveis e fazerem uso da palavra para impressionar os outros. Estas pessoas podem também vivenciar disforia, incluindo queixas de tensão, revelar incapacidade para tolerar aborrecimentos e terem um humor depressivo. Podem ter de forma associada perturbações do controlo dos impulsos, perturbações da ansiedade, perturbações depressivas, perturbações relacionadas com substâncias, perturbação de somatização e jogo patológico. Estas pessoas podem preencher os critérios necessários para outras perturbações da personalidade, particularmente a perturbação de estado-limite da personalidade (boderline) e narcísica (DSM-IV-TR, 2002).
O diagnóstico de perturbação anti-social da personalidade não pode ser feito antes do sujeito ter 18 anos e ter uma história de sintomas de perturbação do comportamento antes dos 15 anos. Esta perturbação afecta mais os homens do que as mulheres. Esta perturbação tem uma evolução crónica, podendo no entanto tornar-se menos evidente com a idade ou remitir, particularmente aos 40 anos (DSM-IV-TR, 2002).
Perturbação estado-limite da personalidade
“A perturbação estado-limite da personalidade, também conhecida por boderline, tem como característica essencial o padrão de comportamento de instabilidade no relacionamento interpessoal, auto-imagem e afectos. A impulsividade mais acentuada começa no início da idade adulta está presente numa série de contextos” (DSM-IV-TR, 2002).
As pessoas com perturbação estado-limite da personalidade podem ter dificuldade em terminar coisas, uma vez que normalmente apresentam um padrão de ruptura consigo próprias quando um objectivo está prestes a se concretizar. Algumas pessoas desenvolvem sintomas de tipo psicótico durante períodos de stress. São sujeitos que normalmente se sentem mais seguros com objectos transitórios do que nas relações interpessoais. O suicídio é uma hipótese que deve ser considerada nos indivíduos com esta perturbação, principalmente se tiverem associadas perturbações do humor e relacionadas com substâncias. Estas pessoas geralmente têm a sua infância marcada por abusos físicos e sexuais, negligencia, conflitos violentos e perda ou separação parental precoce. O diagnóstico destes sujeitos frequentemente é marcado por co-ocorrências de perturbações do Eixo I, nomeadamente perturbações do humor, relacionadas com substâncias, do comportamento alimentar, pós-stress traumático e de hiperactividade com défice de atenção. A perturbação estado-limite da personalidade também ocorre frequentemente com outras perturbações da personalidade (DSM-IV-TR, 2002).
Os problemas psicossociais e ambientais
“Os problemas psicossociais e ambientais podem afectar o diagnóstico de perturbações mentais do Eixo I e II e estão descritas no Eixo IV. Podem ser eventos negativos ou positivos, mas que tanto num caso como no outro são geradores de instabilidade na vida do sujeito” (DSM-IV-TR, 2002).
Para elaboração do diagnóstico o terapeuta deverá anotar apenas os problemas psicossociais e ambientais que ocorreram no ano transacto à avaliação salvo casos em que os problemas psicossociais e ambientais ocorridos anteriormente sejam importantes para o diagnóstico.
A psicoterapia é uma das terapias mais utilizadas para tratamento de transtornos mentais. Estudos comparativos demonstram que a psicoterapia quando comparada com outros tratamentos ou com a psicofarmacologia, é, em geral, eficaz, eficiente e duradoura (Asay & Lambert, 1999; Seligman, 1995 cit in Charman, 2004).
Os tratamentos estão a ser cada vez mais ainda monitorizados quer a nível da sua prescrição quer a nível da definição dos transtornos que são cada vez mais rigorosas (Lampropoulos, 2000). Os transtornos são definidos pelo Diagnostic and Statistical Manual of Mental Disorders (4th ed.) ou Classificação Internacional de Doenças (American Psychiatric Association, 1995), embora as categorias de diagnóstico não captem as diferenças na dinâmica do paciente dentro da mesma desordem e geralmente são inúteis aos psicoterapeutas (cit. in Charman, 2004).

A Relação Terapêutica
Pode-se dizer que o resultado da terapia depende de um conjunto de factores deliberados onde a intervenção surge suportada pelas habilidades, da escolha correcta das técnicas e do treino do terapeuta (Bénomy H. e Chahraoui K).
Segundo Feldman, 2001 a psicoterapia é um processo pelo qual um paciente e um profissional tentam superar as dificuldades psicológicas.
“Muitos métodos terapêuticos têm sido propostos, uns baseiam-se em intervenções biológicas, tal como a medicação. Outros dirigem-se, recorrendo a vários tipos de psicoterapia, ao nível psicológico das perturbações... Algumas das perturbações parecem responder razoavelmente bem aos tratamentos adequados” (Gleitman, 2007).

Existem muitas formas e tipos de psicoterapia diferindo tanto no modo como concebem a psicopatologia, como no modo como entendem a intervenção (cit. in Gleitman, 2007).
Em clínica, a entrevista permite obter informações sobre o sofrimento do sujeito, as suas dificuldades de vida, os acontecimentos vividos, a sua história, a maneira como ele gere as suas relações com os outros, a sua vida íntima, os seus sonhos, os seus fantasmas. A relação terapêutica surge portanto como um instrumento absolutamente insubstituível e único se se quer compreender um sujeito na sua especificidade e pôr em evidência o contexto em que surgem as suas dificuldades (Bénomy H. e Chahraoui K, 1999).
Algumas abordagens baseiam-se na psicanálise e dão relevância aos conflitos inconscientes e encorajam a introspecção. O seu processo realiza-se pela Talking Cure, identificação dos lapsos e os mecanismos de defesa do indivíduo. São processos de interacção ou dito conflitos entre a primeira tópica e a segunda, sendo também cada uma delas alvo deste processo que podem influenciar o desenvolvimento da personalidade. Freud estabelece fases nesse processo onde o ser empera como reflexo da sua percepção e apercepção. Daqui saíram muitas teorias e escolas como é o caso das psicodinâmicas.
Entre as abordagens contam-se também com as Comportamentalistas de Pavlov, Thorndike e Skinner como clássicos deste modelo. Baseiam-se, de forma resumida, em investigações relativas ao comportamento humano e animal tentando identificar respostas não adaptativas e promovendo a aprendizagem de novas respostas (Gleitman, 2007).
Nas teorias cognitivo-comportamentais, uma relação é vista como necessária mas não suficiente para se dar a mudança. Para alguns autores os processos intrapessoais são os principais promotores da mudança. Outros autores acrescentam que a relação sujeito / terapeuta não é isenta da influência das experiências e relações passadas de ambos. (Gilbert & Leahy, 2007)
As perspectivas cognitivistas assentam na premissa de que muitas perturbações mentais se devem a padrões deficientes de pensamento e promovem a aprendizagem de pensamentos mais racionais, como é exemplo a Terapia Racional Emotiva de A. Ellis. Esta terapia fundamenta que o que traz sofrimento ao indivíduo são as suas crenças do comportamento do outro. Estas crenças desenvolvem sentimentos e comportamentos. Ao serem desafiadas e mudadas alteram os sentimentos e consequentemente mudam o comportamento.
Conta-se ainda entre as abordagens as Terapias Humanistas em que têm papel principal a Terapia Centrada no Cliente de Carl Rogers e a Terapia Existencial. “Só o paciente sabe onde e como sofre” (Rogers, 1961). A Psicologia Humanista, abordagem não-directiva tem como conceitos fundamentais: o Método Fenomenológico, a tendência actualizante (a motivação é construtiva, para o seu desenvolvimento enquanto pessoa); a não-directividade. A relação terapêutica e o processo de mudança – A compreensão empática (sem preconceitos), o olhar positivo incondicional (redução das experiências ameaçadoras) e a congruência (não estar preso a sua rigidez). A aceitação do outro; centração no sujeito; empatia; não directividade; compreensão. Há portanto que ter confiança no paciente, escutá-lo plenamente numa atitude compreensiva e respeitosa, que lhe vai permitir desenvolver todas as suas capacidades.
Com as influências da fenomenologia e do existencialismo desenvolveram-se vários modelos terapêuticos que podem ser genericamente designados por psicoterapia existencial e definidos como métodos de relação interpessoal e de análise psicológica cujo objectivo é o de facilitar na pessoa do cliente um auto-conhecimento e uma autonomia psicológica suficiente para que ele possa assumir livremente a sua existência (Villegas, 1988 cit in Handbook of Psychology; 2003). É um tipo de intervenção cuja finalidade principal é ajudar o crescimento pessoal e facilitar o encontro do indivíduo com a autenticidade da sua existência, de forma assumi-la e a projectá-la mais livremente no mundo. A perturbação mental quando presente, é vista como resultado de dificuldades do indivíduo em fazer escolhas mais autênticas e significativas, pelo que as intervenções terapêuticas privilegiam a auto-consciência, a auto-compreensão e a auto- -determinação.
Na psicoterapia existencial enfatizam-se as dimensões histórica e de projecto e a responsabilidade individual na construção do seu mundo. Visa a mudança e a autonomia pessoal. Contudo, vários autores definem a finalidade principal da psicoterapia existencial de diferentes modos: procura de si próprio (May, 1958; cit. in Handbook of Psychology; 2003); procura do sentido da existência (Frankl, 1984; cit. in Handbook of Psychology; 2003), entre muitos. A existência individual caracteriza-se em cuidado, construção e responsabilidade, na medida em que indivíduo cuida de sua existência procurando conhecer-se e compreender-se na relação com o outro. Em quatro dimensões: Física, Social; Psicológica e Espiritual. O encontro terapêutico no método fenomenológico é apreensão da presença do outro “tal como” ele aparece diante do terapeuta. O foco é a realidade do outro. O estilo terapêutico é marcado pela variedade adaptável às necessidades individuais. Perguntas que encorajam a reflexão, auto-exploração, promover o confronto com a responsabilidade existencial e com a liberdade, aumentar a consciência das escolhas e proporciona a possibilidade de mudança ao desafiar o paciente a fazer outras escolhas. O que interessa à fenomenologia é o mundo como é percebido pela consciência de cada pessoa. Nem o mundo nem o sujeito existem isoladamente, o que existe é uma consciência do mundo.
Apresentam-se aqui também outras abordagens que nos pareceram pertinentes para uma melhor compreensão dos processos observados no filme e a sua instrumentalização na concretização dos objectivos terapêuticos que visam a mudança e sua manutenção. Entre várias pode-se considerar a Terapia Analítica Cognitivo (CAT), onde o paciente e terapeuta trabalham em conjunto para alcançar os objectivos. A descrição de procedimentos ineficazes ou prejudiciais ao paciente é fundamental e deriva de experiências precoces e relações.
O procedimento termo refere-se à maneira de um indivíduo de organizar suas vidas e relacionamentos de forma destrutiva e prejudicial (cit. em Charman, 2004). A Terapia de Aceitação Comportamental (ACT) criada por Kohlenberg, Tsai e Dougher em 1993. Baseiam-se na observação dos comportamentos clinicamente relevantes e o terapeuta constrói um ambiente favorável a sua evocação, reforça os progressos, observa os efeitos. Este modelo considera que os comportamentos ocorrem devido às contingências do reforço experimentados nos relacionamentos passados, a aprendizagem do indivíduo, da sua história, como chamar a um comportamento de patológico de ele ocorre entre o indivíduo e o meio (Banaco, 1997).
A Entrevista Motivacional Miller e Rollnick pode ser usada em contexto fora da adicção, nesta abordagem reforça-se que o estilo e a personalidade do terapeuta têm um efeito para a consistência da relação terapêutica, o que leva à concretização das motivações e mudanças. Na sua obra questionam a motivação do problema de personalidade e estabelecem técnicas de intervenção bem como definições de abordagens para combater pacientes mais resistentes. São conhecidas como os quatro “R”s, relutância, rebeldia, resignação e racionalização. As técnicas assentam numa mnemónica FRAMES: F é o Feedback, R de responsabilidade; A de aconselhar; M de menu ou opções; E de empatia e S de Self-eficácia (Miller W. e Rollnick S, 1991). O Modelo Transteórico de Mudança de Prochask e DiClemente fala-nos da mudança numa perspectiva de abordar as fases com as técnicas correctas para o paciente. Percorrer desde o estádio de pré-contemplação, contemplação, determinação, acção e manutenção. A acção de mudar cria stress e envolve processos que podem desencadear em determinados indivíduos estagnação ou actividades deslocadas. Este modelo visa a adaptação das fases de forma a concretizar os objectivos (Aconselhamento, Manual Técnico1, 2004).
Segundo Holmes (2001) existe um amplo consenso na maioria das terapias que a relação terapêutica deverá promover a segurança do sujeito no terapeuta.
A forma como os terapeutas desenvolvem as ligações terapêuticas terá impacto no compromisso com a tarefa e com os objectivos (Gilbert & Leahy, 2007)
As mais recentes teorias sobre a importância da relação terapêutica defendem que: é um acordo em objectivos, é uma atribuição de uma ou várias tarefas e é o desenvolvimento de ligações.
O processo de tratamento inclui vários factores tais como: saúde psicológica do paciente; a capacidade do paciente para os relacionamentos interpessoais; a aliança terapêutica, a confiabilidade e validade das formulações dinâmicas; a capacidade para internalizar representações do terapeuta e da terapia; as características de interpretações precisas (Luborsky et al., 1993 cit in Charman, 2004).
A grande descoberta da empatia parece ser o caminho essencial para uma boa relação terapêutica, a abertura da porta que não se queria abrir. A melhoria dos instrumentos de diagnóstico e dos instrumentos de avaliação bem como a evolução das técnicas contribuiem para uma intervenção terapêutica a níveis nunca antes alcançados. A relação terapêutica parece assim ser fundamental para o sucesso do processo de mudança, e a confiança, a mãe que alimenta, como a mão que cura.

MÉTODO
Amostra
Will Hunting, personagem principal do filme “O bom rebelde”

Delineamento
Visionamento do filme “O bom rebelde” de Gus Van  Sant de 2000. Will Hunting é um jovem adulto de 20 anos. É órfão e foi criado em orfanatos onde sofreu abusos físicos e psicológicos. Nunca frequentou a universidade, como aluno. Trabalha no M.I.T. (Massachussets Institute of Technology ), como empregado de limpeza. Quando não está a trabalhar está com os seus amigos no bar local e arranja sarilhos, que com frequência o levam à esquadra de polícia e mesmo à prisão.
Apesar da sua história de vida Will é um jovem com uma mente brilhante, tem uma grande memória fotográfica, que lhe permite ter uma grande cultura geral, em simultâneo com uma capacidade fora do comum para resolver problemas matemáticos. Will não valoriza as suas capacidades porque para ele são coisas fáceis, ou seja, não constituem um desafio. Não consegue estabelecer nenhum tipo de relações, apesar da amizade que matem com três amigos que o acompanham. O facto de não conseguir confiar em ninguém afecta várias áreas da sua vida.
O professor Lambeau é um laureado prémio Nobel da matemática que lecciona no M.I.T., um dia desafia os alunos a resolver um teorema que até para ele é difícil. Qual não é o seu espanto quando descobre que o mesmo foi resolvido pelo empregado de limpeza, Will. Quando o professor Lambeau tenta aproximar-se de Will Hunting descobre que este está prestes a ir para a prisão por mais um desacato. Perante tal génio o professor Lambeau procura as autoridades e propõe-se reabilitar o jovem. Para o efeito e afim de Will Hunting não ir uma vez mais preso vai ter que fazer terapia e ter aulas de matemática com o professor. As aulas é algo que Will Hunting faz com facilidade o problema está na psicoterapia porque não consegue estabelecer uma relação terapêutica, porque simplesmente não consegue estabelecer uma relação de confiança com ninguém.
Após ter estado com vários terapeutas sem resultados terapêuticos, não passava da primeira sessão, encontra-se com um professor universitário, Dr. Sean Maguire. Este professor lecciona uma cadeira de psicanálise mas que não tem experiência de consultório. É o Dr. Sean que ao entender sua revolta emocional e com métodos pouco convencionais consegue estabelecer uma relação de confiança com Will e consequentemente uma relação terapêutica.  Esta relação vai mudar para sempre a vida de Will  porque o Dr. Sean Maguire consegue ajudá-lo e motivá-lo para a mudança.
Os discursos entre o Terapeuta e o paciente são ricos no sentido terapêutico mesmo nos silêncios há um encontro, as sessões vão reforçando a relação e o momento acontece. Escolhemos para a apresentação oral dois momentos o da primeira sessão e o da última cujos diálogos se encontram transcritos em anexo.
Método utilizado foi de observação não participante.
Instrumentos de Avaliação
Anamnese
Anamnese, em francês anmnése em inglês anamnesis. É um termo que tem origem na filosofia e é adoptado posteriormente pela medicina. A anamnese é o conjunto de informações recolhidas a respeito do passado de um sujeito e que são necessários para o clínico fazer uma avaliação. A anamnese pode designar também o método de investigação para recolha de dados clínicos, sendo assim chamada de interrogatório anamnéstico ou de anamnese associativa (Dicionário de psicologia, 2001). A concepção de anamnese foi evoluindo ao longo dos tempos desde os alienistas seguidos dos psiquiatras e por último dos médicos psicossomáticos e psicólogos clínicos. Esta evolução deu-se de acordo com quatro fases correspondentes à evolução geral das ideias do psiquismo. Cada uma destas fases marcou a necessidade da recolha deste tipo de dados (Dicionário de psicologia, 2001).
Nos alienistas, seguindo uma filosofia hipocrática, a anamnese confina-se à história da doença. Foi com P. Pinel e J. Esquirol que o inquérito se estendeu à busca de informação sobre o estilo de vida do doente e a possíveis acontecimentos desencadeadores das perturbações. B. Morel e J. Magnam, nas suas concepções referentes à degenerescência progressiva hereditária suscitam o interesse pelo passado familiar do doente. Por último a psicanálise explora a vida imaginária e o passado mais antigo do sujeito. Todos os métodos de anamnese da actualidade apresentam estas quatro fases de investigação, na maioria das vezes por esta ordem, porque respeita as resistências do sujeito e lhe permite a sua atenuação progressiva (Dicionário de psicologia, 2001).
Esta pesquisa de informação é de tal forma importante que em algumas áreas vêem-se surgir novas técnicas de investigação, nomeadamente o genograma que é resultado da evolução das terapias familiares (Dicionário de psicologia, 2001).
A anamnese é utilizada hoje em dia sobretudo pelos médicos psicossomáticos e por psicólogos que não trabalham numa perspectiva psicanalítica. A anamnese pode seguir duas metodologias: interrogatórios anamnésticos, que são de uma forma geral sistemáticos e pormenorizados. A desvantagem desta técnica de recolha de dados é que pode comprometer os resultados da psicoterapia se for entendida pelo sujeito como abusiva. Outro dos problemas que pode causar é aumentar as resistência do sujeito ou suscitar ma reacção transferacioal. Por último priva o clínico de saber porque ordem e de que forma o indivíduo teria facultado os mesmos dados se tivesse tido a liberdade de se expressar à sua maneira. A anamnese associativa, assim designada por F. Deutsch, é um método mais flexível. Consiste num número mínimo de perguntas directas ou mesmo a total ausência de perguntas. Não tem as desvantagens do interrogatório anamnéstico motivo pelo qual é mais utilizada por psicólogos e psicanalistas (Dicionário de psicologia, 2001). (Anexo III)
DSM-IV-TR
O DSM é um manual de diagnóstico e estatística de doenças mentais. Serve para ajudar no diagnóstico médico. No caso do DSM-IV-TR está organizado de forma a dividir as perturbações mentais em tipos, com base num conjunto de critérios com características definidoras. No entanto, não havendo dois sujeitos iguais o terapeuta ao fazer determinado diagnóstico a um conjunto de indivíduos com a mesma perturbação leva em consideração a heterogeneidade dos mesmos, ou seja, embora o diagnóstico seja o mesmo o caminho para lá chegar foi diferente de sujeito para sujeito (DSM-IV-TR, 2002).
As perturbações são classificadas segundo um sistema de códigos e categorias, tendo como ponto de partida os Eixos I, II, III. O Eixo IV serve como indicador dos problemas psicossociais e ambientais que podem afectar o diagnóstico, a terapêutica e o prognóstico de perturbações mentais. O Eixo V serve para o terapeuta indicar o nível global de funcionamento do indivíduo. Descrição dos Eixos (Anexo I),. Descrição da GAF (Anexo II)
SCID-II, Entrevista Estruturada para os distúrbios de Personalidade do Eixo II
SCID-II, Entrevista Estruturada para os distúrbios de Personalidade do Eixo II, é constituída por uma escala que avalia vários distúrbios da personalidade tais como:
Distúrbios de personalidade evitante
Distúrbios da personalidade dependente
Distúrbios de personalidade obsessivo-compulsivo
Distúrbios de personalidade passivo-agressivo
Distúrbios de personalidade paranóide
Distúrbios de personalidade esquizotipico
Distúrbios de personalidade histriónico
Distúrbios de personalidade Narcísico
Distúrbios de personalidade borderline
Distúrbios de personalidade anti-social

PROCEDIMENTO
            Análise do filme “O bom rebelde”, numa prespectiva clínica utilizando os meiso de diagnóstico, anamnese e SCID-II, Entrevista Estruturada para os distúrbios de Personalidade do Eixo II

RESULTADOS
O resultado final segundo a classificação do DSM para o caso observado foi o seguinte:
Eixo I

Nenhum
Eixo II  
301.7
Perturbação anti-social da personalidade [F60.2] 

301.83
Perturbação do estado-limite da personalidade [F60.31]
Eixo III

Nenhum
Eixo IV

Vitima de negligência infantil


Apoio Social inadequado na infância e adolescência


Detenção; passado e presente
Eixo V
AGF=90

DISCUSSÃO
O sujeito tem fortes indicadores de uma perturbação do Eixo II, motivo principal da sua consulta. A perturbação identificada enquadra-se na 301.7 perturbação anti-social da personalidade [F60.2], uma vez que cumpre os seguintes critérios: B e simultaneamente C – tem mais de 18 anos e existe historial de que o comportamento começou antes dos 15 anos. A1 – O padrão anti-social continua na idade adulta. As pessoas com perturbação anti-social não interiorizam as normas sociais no que diz respeito ao comportamento legal, já esteve preso e está em condição eminente de o ser novamente. A2 – São pessoas frequentemente fraudulentas e manipuladoras com vista a obterem lucro pessoal ou prazer, usa os outros e manipula-os de acordo com a sua vontade. A3 – Podem mentir repetidamente, usar nomes falsos, contrariar os outros ou simular, quando confrontado com situações de que quer fugir mente ou manipula a informação dada de forma a esquivar-se ao confronto com a verdade. A4 – As decisões são tomadas por impulsos momentâneos, sem premeditação e sem consideração pelas consequências nos outros ou em si próprios, devido a estes impulsos frequentemente se coloca em situações de conflito legal. A5 – Estas pessoas demonstram um desprezo irreflectido pela sua segurança pessoal ou dos outros, não revela pudor em usar a força física e consequentemente se meter em brigas de corpo a corpo. A6 – As pessoas com perturbação anti-social da personalidade tendem também a ser extremamente e conscientemente irresponsáveis, apesar de ter consciência das consequências dos seus actos não os evita. A7 – As pessoas com perturbação anti-social da personalidade mostram poucos remorsos pelas consequências dos seus actos, apesar de ser punido pelos actos que pratica não revela arrependimento.
O sujeito apresenta algumas manifestações de comportamento que se enquadram num quadro clínico da 301.83 perturbação do estado-limite da personalidade [F60.31]. Os critérios que o indivíduo cumpre são: Critério 1 – Estas pessoas são muito sensíveis às circunstâncias ambientais. Apesar das várias propostas de emprego que iriam melhorar em muito a sua situação económica não aceita nenhumas porque isso o ria afastar dos seus amigos. Critério 3 – Estas pessoas podem passar subitamente passar de um papel de necessidade de ajuda para o de justiceiros de ofensas passadas, a briga que provocou e o levou à situação actual de iminente detenção foi um ajuste de contas com um ex-colega de orfanato que à época o espancava. Critério 6 – Os sujeitos com perturbação de estado-limite da personalidade podem demonstrar instabilidade afectiva devida a uma reactividade de humor marcada, por várias vezes o sujeito entra em confronto verbal directo com terceiros afim de defender os amigos. Critério 7 – As pessoas com perturbação do estado-limite da personalidade podem ser perturbadas por sentimentos crónicos de vazio. Estas estão sempre à procura de alguma coisa para fazer. O sujeito é um autodidacta, apesar de nunca ter frequentado a universidade revela um conhecimento de nível superior e tem uma cultura alargada a vários domínios. Critério 8 - As pessoas com perturbação do estado-limite da personalidade podem mostrar sarcasmo extremo, mordacidade continua ou explosões verbais, utilizado de cada vez que se vê obrigado a ir a uma consulta de terapia.
A origem das problemáticas do sujeito podem ser explicadas com os seguintes critérios do Eixo IV. Problemas com o grupo de apoio primário, uma vez que sofreu de negligência infantil e durante a infância e adolescência sofre abusos físicos, enquanto viveu em orfanatos e por parte do pai adoptivo. Problemas relacionados com o ambiente social, nomeadamente no que concerne à falta de apoio social inadequado, viver só e de discriminação. Problemas relacionados com a interacção com o sistema legal/crime, uma vez que já esteve preso e neste momento encontra-se em perigo iminente de voltar a ser preso a não ser que aceite ajuda terapêutica para mudar o seu comportamento. Optou-se por esta explicação do Eixo IV por se verificar que o sujeito os comportamentos do sujeito são um continuo na sua vida e não só no ano antecedente à sua consulta.
Conclusão
As teórias explicativas do fenómeno sobre a relação terapêutica encontram uma resposta comum e central que vai ao encontro da hipótese levantada “Como funciona a relação terapêutica e a sua importância” de que é a relação terapêutica e a forma como ela se estabelece a peça fundamental em todo o processo para se efectivar o processo de motivação que leva a mudança e em que o terapeuta desempenha um papel activo.
O objectivo do trabalho centrou-se em perceber a eficácia da relação terapêutica no indivíduo em observação. Levantar hipóteses com uso de métodos de avaliação e de diagnóstico padronizados, medindo o comportamento e caracterizando-o. Descrevendo, compreendendo e explicando vai-se percebendo a eficácia da relação terapêutica no indivíduo em observação, prova disso é a modificação do seu comportamento.
No diagnóstico definitivo foi encontrado uma patologia 301.7 perturbação anti-social da personalidade [F60.2] e 301.83 perturbação do estado-limite da personalidade [F60.31]. A origem tanto de uma como de outra problemática do sujeito podem ser explicadas com os critérios do Eixo IV. Optou-se por esta explicação do Eixo IV por se verificar que os comportamentos do sujeito são um continuo na sua vida e não só no ano antecedente à sua consulta.
Problemas com o grupo de apoio primário, uma vez que sofreu de negligência infantil e durante a infância e adolescência sofre abusos físicos, enquanto viveu em orfanatos e por parte do pai adoptivo. Problemas relacionados com o ambiente social, nomeadamente no que concerne à falta de apoio social inadequado, viver só e de discriminação. Problemas relacionados com a interacção com o sistema legal/crime, uma vez que já esteve preso e neste momento encontra-se em perigo iminente de voltar a ser preso a não ser que aceite ajuda terapêutica para mudar o seu comportamento.
A delinquência juvenil do jovem pode não estar comprometida com o diagnóstico do DSM-IV-TR e realizado no decorrer deste trabalho. A personalidade anti-social diagnosticada apesar de assentar nos critérios de diagnóstico do DSM-IV-TR pode não estar totalmente favorecida. Por não se conhecer os factores de futuro do seu comportamento, e o sujeito poder vir a sofrer de resiliência ou de outro tipo de activação do meio, desconhecemos como vai ser na prática o seu envolvimento social, que bem pode activar os mecanismos de defesa. O que para nós é desconhecido não pode ser opinado. No período de tempo em que decorre o filme as mudanças foram reais e levaram ao processo de tomada de decisão. Devido a estes factores qualquer conclusão por sofrer de desvios pode ser precipitada.
É do senso comum que em fases da adolescência certos jovens desenvolvem comportamentos de risco e metem em causa a sociedade em que vivem, o problema estabelece-se quando esses comportamentos permanecem no tempo. Seria também pertinente o acesso a dados de estudos realizados sobre a permanência desses comportamentos, a sua taxa, e quais foram os que por si só, sem qualquer tipo de intervenção mudaram, e os que mudaram com intervenção terapêutica qual foi o seu desenvolvimento.
Para ser diagnosticado como um delinquente infantil, um jovem tem de mostrar um padrão estabilizado no seu comportamento, que demonstre um continuo desrespeito pelos valores da sociedade, regras e direitos dos outros e pelas leis. Baseado nesta definição, “O bom rebelde” é um jovem delinquente.  Foi criado num lar problemático, espancado fisicamente e abusado psicologicamente. Várias situações de furto, agressões e problemas legais. No entanto um génio. Em boa verdade seja dito que algumas pessoas podem efectivamente estar a lutar para encontrar o seu caminho por eles próprios porque as famílias deles falharam ao não lhes deram a orientação que precisavam, outros, ainda, porque não a souberam ou não tiveram a capacidade de a acolher.
Pelas várias perspectivas teóricas o mesmo comportamento pode ter origens e motivações diferentes e podem ser entendidas tendo em conta o tipo de pessoa e em que situação se encontra. Os métodos de avaliação da personalidade são também eles alvos de controvérsia.
A problemática envolta nas abordagens, levanta as seguintes questões: Qual a mais eficaz? Qual é a que vai ao encontrar do paciente? Como é que ele se estrutura nesse encontro? Como se torna ele próprio com sentido de vida? Todas estas questões encontram uma resposta comum e central, a relação terapêutica. A relação terapêutica parece ser uma peça fundamental em todo o processo. Mas talvez seja melhor ficarmos pelo veredicto do pássaro dodo de Alice no País das Maravilhas.
Podemos encontrar críticas à intervenção terapêutica em estudos de Eysenck (Gleitman, 2007) onde é posta em causa a eficácia das abordagens. No entanto outros estudos não corroboram da mesma opinião.
“Não preciso de terapia” é uma afirmação do jovem no decorrer do filme e que levanta a questão da motivação para o processo de mudança e do estabelecimento da relação terapêutica, e ainda, da questão quem são na realidade os que mais precisam dela, os mais necessitados, e qual o papel do terapeuta, Vous ête engagé de Satre parece uma afirmação pertinente para o processo de mudança se poder realizar. Algumas abordagens motivacionais preocupam-se com o estádio de pré-contemplação.
A grande descoberta da empatia parece ser o caminho essencial para uma boa relação terapêutica, a abertura da porta que não se queria abrir. A melhoria dos instrumentos de diagnóstico e dos instrumentos de avaliação bem como a evolução das técnicas contribuíram para uma intervenção terapêutica a níveis nunca antes alcançados. A relação terapêutica parece assim ser fundamental para o sucesso do processo de mudança, e a confiança parece ser a mãe que alimenta tal como a mão que cura.


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*Álvaro Carvalho, Gualdino Sacramento e Isabel Soares.