quinta-feira, 22 de março de 2012

O Rio já não está onde estava, todos os dias muda. Mas ultimamente têm mudado muito depressa.


Para onde foi tanta água?

O que é feito das musas do Tejo, que se encontra tão vazio na sua alma, onde estão os poetas, dizem que ficou por outras terras, ou que vêm a caminho. Mas está raso no seu leito, nem dorme de tanta sede, garganta de Tântalo, sedento da água da vida. Dos olhos do poeta que dizem o que vêem ou o que os olhos não sentem. Dorme o rio, descansa o tempo nas águas do passado. As suas águas já não chegam ao cais, onde penélope espera. E desfiando o tempo, para que ele não acabe antes do tempo, vais na esperança de que as águas voltam a sua foz, para não voltaram de onde vieram mas que sigam o seu destino.

Tudo mudou o relógio que noutros tempos era o tempo real hoje apenas está certo duas vezes por dia mesmo parado dá um tempo que não volta, porque os seus ponteiros não rodam, não há mudança então nada muda.
Deve ter sido das obras que durante tanto tempo não me permitiram ver o cais ou estar de volta ao cais de embarque, de partida, de novos rumos, de novos desafios. Este cais hoje apenas serve para ver as vistas mas já foi inspiração de almas que andam pelo mundo sem o serem, deste mundo.


Tiramos a água do rio? Para onde foi tanta água? Foi a nossa sede que secou a fonte, a nossa ambição deixou-nos um futuro deserto. Como se pode partir se a água já lá não chega e onde não há água não há vida. Como alguém diz não há nada, não há dinheiro, não futuro, não há nada. Mas como tudo deve fazer sentido nem que seja o sentido de se ter perdido tempo esperando que a água volte ao cais, donde partiram as naus e caravelas e onde se escondem “os velhos do restelo”.
Os carros passam por mim vazios não vejo ninguém lá dentro, nem se apercebem que ali estou nem que o rio está muito vazio. Todos passam e não olham, correm antes que alguém lá chegue, só que não está lá ninguém. O nada, é tudo e isso dá uma sensação de vazio mas acredita-se que é paixão. Sonhasse que amanhã será melhor e que talvez o Tejo se encha por ele, nunca o vi tão vazio e não entendo o sentido que isso representa na minha vida mas dá-me uma angústia que me atormenta, que é de não vermos que estamos a perder a vida e que vivemos sem a viver, sem ser. Acredita-se e pronto.
Alguém se prepara para partir desse leito da vida, alguém sabe e sente que chegou a sua hora e não está feliz porque sente o que perdeu e já não vai a tempo, enfim deixa-me triste ver no cais a água que demora em chegar. Vejo isso no teu olhar, vejo isso nas sombras que nos acompanham, sem vaidade, sendo apenas sendo parte de um todo, da vida, da sua e da dos outros. Hoje sei que foi uma despedida, hoje vi nos teus olhos que não querias sofrer, que querias tempo para amar. Mas nós não temos tempo, vivemos o tempo. Perguntaste-me como se aceita, não tenho resposta, pois há coisas que não se aceitam porque apenas acontecem sem explicação, sem qualquer justiça ou verdade. Apenas acontece e isso é, porque estamos vivos. Mesmo que não façam agora sentido acredito que só depois percebemos, só depois.
Respeito o rio e as suas margens porque é nelas que o rio se estrutura, mesmo que rebente o dique é porque se prendeu o rio e era tempo, não o que se quer mas o que se tem. Quando vejo o que o rio deixou para trás, vejo o que ele foi e assim ele existiu para dar sentido a vida dos outros, este é um rio que foi o que já não é, mas que não deixa de o ser, pois mesmo com pouca água o rio está lá e nós demoramos é m pouco mais tempo até ele e aí se descobrem ouras e novas margens por nós antes desconhecidas e com medo de se perder o que se tem em vez de se valorizar o que se foi sendo.
 Estas são ás águas da vida, da nossa vida e do que vamos fazendo dela. Mas, por mais longe ou vazio de água que o rio esteja, ele na realidade ainda lá está, só que mais longe e enquanto aí estiver eu vou ao cais para ver partir e regressar a esperança que só as águas de um rio sabem transportar. A vida na vida, sempre. Obrigado.

*Álvaro dos Santos Carvalho
22 de Março de 2012.

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