01 de Abril
de 2012
Na hora
marcada, o Tobias apareceu com um ar combalido mas tentando não demonstrar que
estava em baixo. Está frio, disse, como desbloqueador de conversa, estamos na
primavera e nada, agora vem a chuva, está tudo esquisito não entendo nada do
tempo, bruuu. está frio. Bem então vamos falar do tempo que está a influenciar
o teu humor. Sim é do tempo eu não devia estar assim, estou de mau humor e já
pensei se não é da lua cheia. Mas não está lua cheia. Pois não! não está. Nem
sei onde ela está. Quem estás a falar de alguém. Não estou a falar da lua e do
Sol e da chuva e de como fico mal comigo quando não há razões para me sentir
assim intolerante, mas mesmo de muito mau humor, chateado e pronto a chatear
alguém. Bem, fui pensando que talvez houvesse algo do qual ele não queria falar
e fui me perguntando se devia dar uma dica ou continuar a ouvir estilo tabua
rasa ou de quem não tem estilo e procura ser aceite pela sua boas capacidades
de audição filtrada na consciência. Nega-se o facto de ser o inconsciente que
filtra e acredita-se que é de forma consciente, lindo, ninguém está doente ou
então todos estão perto de limiar da excitabilidade, prontos a trocar sódio por
potássio. Aqui houve um momento em que me apeteceu olhar para o relógio para
ver com quanto tempo íamos de terapia, pois não era uma conversa de café.
Apeteceu fumar um cigarro, e pensei que seria eu a evitar o confronto directo
do seu mau estar. Bem diz lá, queres mesmo me dizer qualquer coisa não é? Como
sabes fez-se o Tobias de desentendido. Talvez os meus olhos tenham brilhado,
talvez tenha mudado de posição na cadeira, mas o certo é que ele se abriu a ele
próprio. Bem, com medo e de uma forma tímida e não de negação, iniciou. Bem, é
que afinal tens razão. Custa-me a admitir, fere-me o meu orgulho, estou
desolado, triste e abatido. A sua auto-piedade podia me comover ou dar raiva. Estás
a justificar o que queres dizer podes ser mais objectivo. Sim tem que ser,
tenho que admitir que tenho um problema sério comigo e que me faz ter um
problema sério com os outros. Não tenho nenhum problema com o Sol, com a vida,
com a Lua ou com as marés. Eu sou o meu problema e não o consigo resolver
porque não quero admitir porque não estou interessado em aceitar está condição.
Tudo bem, disse eu na minha tranquilidade. Tudo bem nada tudo mal, saltou o
Tobias da cadeira e foi até a janela, a qual ele não chegava e voltou a sentar.se
para se deitar e com o focinho entre as patas surpreendeu na sua atitude. Pois
é descobri que sou mesmo um caniche toy, sou desta marca, ou desta etnia, não
sei de nada e estou perdido dentro de mim porque este eu nunca existiu. Fiquei
pasmado mas como? como é que depois de tanto trabalho ele afinal acreditou,
agora sim vai deprimir e entrar em contacto com a consciência, com a sua
realidade. Então Tobias como é que chegas-te a essa conclusão. Foi fácil
percebi que não crescia e que por vezes sou um brinquedo. Estive a ver um filme
dos Dalmatas e percebi que não era igual a eles e depois fui ler um livro e vi
ma imagem de um Rotwailler co espuma e baba nos cantos da boca e percebi que
não era igual a ele. Então se tenho que ser igual a mim é porque sou eu, e
procurei e encontrei na net fotos de caniches toy’s e sou parecido. Tenho que
admitir mas agora ainda fiquei pior. Pois sabendo quem sou não me ajudou a
sentir melhor, talvez fosse preferível viver uma ilusão. Sempre seria a minha
vida e nela eu seria o que queria e não o que me foi imposto. Estamos mesmo na
Era do Vazio, Existencialismo puro e duro. Tobias procura Sartre e a sua
dimensão de felicidade, onde o Homem é dono de seu destino e onde não há saída.
Não estejas tão pessimista, disse-lhe eu tentando o animar, apetecia-me dar-lhe
um abraço. Mas não me levantei, nem fiz esforço nenhum para isso. Podia ter-lhe
perguntado, mas talvez me saísse o tiro pela culatra. Acreditei que estávamos no
caminho certo para ele poder ser ajudado e qual não é o meu espanto quando o
Tobias solta um suspiro e exclama: - Preciso mesmo de ajuda, estou a precisar
de ajuda. Ok, estamos lá. No ponto e no momento certo. Num ápice o Tobias
levanta-se e agradece a consulta e diz que volta para a semana, pois tínhamos acabado
o tempo. Mas o tempo nunca acaba porque é nossa invenção. Então Tobias, ficamos
assim? Sim hoje terminamos mas eu volto. Pronto, terminamos a sessão e ele saiu.
Ao sair reparei que ele ia a abanar o rabo todo contente para o quarto da
menina e que ia a brincar, feliz. Nem fomos a rua, mas porque é que ele vai
feliz se estava tão em baixo na consulta, será euforia ou mania ou voltou a
negação. Fiquei confuso e pensei que talvez a supervisão me ajuda-se a
compreender todo este momento feito de alterações de comportamento e onde a
palavra usada não estava relacionada com nada do que via. Então tive um flash,
olhei para o calendário e vi, vi o que não queria ver. Hoje é dia 1 de Abril e
isto foi uma partida do Tobias. este dia não existiu porque é mentira.
*Álvaro de Carvalho
Sem comentários:
Enviar um comentário