25 de Novembro de 2011
Hoje, tudo
está no seu lugar graças ao Tobias que chegou a horas e iniciou-se o diálogo,
chamemos antes monólogo, pois há terapias que são mais isto do que dialéctica. A
dialéctica com um significado de um método de movimento do pensamento. A
reflexão da razão dialéctica sobre si própria pode ver-se no percurso entre o
antes e o depois, onde o ser toma consciência de si próprio. Então aqui reside
a razão fundamental do efeito terapêutico. E daí a razão do Tobias discutir mais
comigo do que com ele próprio, afirma-se em mim e comigo. Hoje, talvez tenha
algo, ao qual posso chamar de angústia, não é medo, é outra coisa, como uma angústia,
estás a ver? Perguntou-me ele, ficando com o olhar parado no tempo, como se
fosse aquele o momento em que se descobre nada mais haver para além da
condição, da sua condição, das suas dúvidas existenciais. Eu não “via” nada,
mas segui-o com atenção: como assim? O que queres dizer com, estás angustiado.
Não sei, talvez seja do meu problema! Hum! Afinal, sempre temos um, problema.
Qual problema? Indaguei eu. Então sabes bem que tenho tido problemas desde que
aqui venho, tens-me confrontado com a minha condição de não querer ser aquele
que não sou. Eh, lá, agora o problema, sou eu, que transferência é esta? Ou
será efeito da terapia que quebrou a negação e o colocou em depressão antes da
aceitação. Um confronto directivo tem sempre os seus efeitos práticos, nem que
seja zangar o paciente e fecha-lo, resistência, claro, sem dúvida. Ora bem, então
reconheces que há um certo problema associado a tua personalidade, que se vê
reflectida na tua imagem, distorcendo o real do ideal do Self. Disse-lhe em tom
de seriedade e numa questão aberta, coloquei-o perante a obrigação de
responder, fazendo participar na sessão pois torna-se necessário participar, se
não, é simples não há sessão terapêutica. Mas então o silêncio não é
terapêutico, sim claro, mas o silêncio de que falo é aquele do filme do César
Monteiro sem imagem e da música sem som, é o do som de um bater de palmas com
uma só mão. Ele olhou para mim e perguntou-me: com um olhar triste e vago,
estamos a falar de quê? Ah, já sei de eu não querer ser um caniche, não me
sinto assim, e não posso ser o que não sinto, seria estar a enganar-me a mim e
aos outros. E que dizem os outros, questionei eu. Quais outros? Os outros são
os outros e eu sou eu, disse ele num tom seco e que eu achei arrogante. Não
podes estar isolado no teu mundo, vives com os outros e precisas dos outros,
não é verdade? De onde vem a tua auto-estima? A minha auto-estima vem de ser
quem sou, um rottweiler e não aquilo que os outros querem que eu seja. Já li
muita coisa e sei que isso de dar ouvidos aos outros, se chama, emprenhar pelos
ouvidos, ser parte do rebanho ou influência social. O homem torna-se
prisioneiro das suas decisões, não é livre, pois tem consciência e a liberdade
está associada e confunde-se ao homem alienado no grupo, na sua totalidade
passiva, que se produz como factor para a sua integridade, renega a sua
condição em proveito de um todo, este alienado pelo social encontra-se vazio,
desprovido de sentido como um Robinson Crusoe que se vê preso na liberdade da
sua condição, na qual não teve escolha, ou livre arbítrio. A consciência sofre
da intencionalidade da fenomenologia e do inconsciente Freudiano. Ter
consciência é ter sempre consciência de algo, de Husserl, em Hume até Sartre. Eu
sou mais aquele igual ao homem que ultrapassa as dificuldades e que se fez a si
próprio. Lembrando Saint Genet de Sartre ou a Resiliência das crianças do Haiti.
Eu ripostei, mas tu não estás só no mundo, pois tens a liberdade de não
escolher e estás sempre colocado diante do outro. O absurdo da existência é sem
dúvida o encontro que fazes contigo mesmo pelo confronto com os outros, “Houis
clous”, será sempre o infindável truque mágico da fé no humanismo, na viagem
Utópica de Moore. O Tobias ripostou, logo e também, na sua cultura, mas é
também o Absurdo de Camus. Eu aproveitei e filosofei mais, para o confundir
numa intelectualização de razões absurdas mas vincadas de significância do seu
significado, pois também é uma técnica, ouvi dizer por ai, que deixar alguém confuso
é bom para se poder tomar uma decisão ou uma não decisão. Como é que o mundo, a
vida pode adquirir um sentido para ti? se estás ausente do sentido de ti,
procuras o teu reflexo numa passagem do tempo onde te esqueces-te de ser o
futuro. Sendo considerado motivação as falhas do passado projectadas no futuro,
como se fosse para chegar a algo que se quer conhecido antes de se ter
descoberto. Um homem não é mais do que a soma dos seus actos. Onde, os seus
“actos falhados” são a inconsciência da sua verdade, porque falhamos ao optar,
ao escolher, castrados da realidade da decisão é nos permitido escolher
moralmente o que vai contra os desígnios do homem e acarreta culpa, Sísifo subindo
e recomeçando numa programação ao estilo de Matrix para não ser esquecida, para
doer na consciência, na condição ou num “País das Maravilhas” onde Alice se
perde para se encontrar. Tu não serás outro se não fores tu próprio, assim
ficas confuso, e deves ter em consideração o viver em comunidade, com os outros
para os outros, assumindo o teu papel, tu és o actor, o fazedor da tua
realidade. Então estás-me a dar razão, disse o Tobias com os olhos meio a
brilhar, posso ser quem eu quiser, não há juízos, preconceitos, nem prévias
condições. Posso ser um rottweiler, certo? Mas se estabelecer a minha condição
nos outros, vou ser Julgado pelo seu olhar, o olhar não reflecte nada do Ser,
pois apenas é reflexo do que os outros julgam parecer. Nada é o que realmente
parece. Então posso estar em dúvida com a minha condição. Posso ser quem eu
quero, num eu imaginário, sem ser preciso estar fixado numa convenção de
marcas, de produtos, de números, de classes. Como sou eu? se tenho que ser eu
com os outros. Queria-me refugiar na mentira, nas desculpas, nas justificações,
queria ser incapaz de distinguir para poder perseguir, sem vantagens, sem o
juízo critico, cínico ou clínico, sem o olhar do outro sobre mim que me julga
nos seus conceitos, pré-conceitos e des-feitos, que é uma forma nova de dizer,
aquilo de que não somos feitos. A medida que vamos aprendendo, a verdade,
deixamos as máscaras, caiem também os personagens, já não há palmas na plateia,
e o actor está nu, e mesmo assim haverá algo para retirar nem que seja a sua
mente. Despido de si, vai um homem consciente de si. O homem já não é senhor na
sua casa, ficou no divã, eu não quero isso para mim. E, ando bem pior, desde
que faço aqui terapias contigo, antes, não tinha estes problemas era um cão e
isso bastava-me. Agora estás a exagerar, foste tu que vieste com essa dúvida de
seres o que não pareces. Como? Não, pareço? Levantou-se o Tobias numa atitude
de revolta e barafustou entre dentes grunhidos que não se distinguiam porque
eram, assim mesmo, indefinidos mas cheios de «rrrrrrrrrrrrrrr», agora estou
mesmo zangado até tu me olhas com um ar critico e julgas o meu aspecto. Estou
só! Gritou num desespero que até me fez doer a alma. Estou só, estou mesmo só. Repetiu
em surdina, o que me deu espaço para entrar e confrontar este comportamento. Então!
Agora estamos com a Autopiedade, a bater à porta, não te estejas a bater, pois
estás a desviar o assunto e a transferires a tua raiva para cima de mim. Olha,
já fui vacinado, clarificou o Tobias com frontalidade e não tarde nada, estás a
dizer que tenho um comportamento atípico, ou anti-social, que sou doente e que
isto não tem cura ou que o problema é com o abandono da mãe ou do Pai ou então
da sexualidade reprimida. Não quero saber. Assim não vamos a lado nenhum.
Quando é a próxima sessão, vou ver se venho! Claro que vens, estamos apenas no
princípio. Anda Tobias, queres vir a rua? Vamos! Anda, vamos a rua, Tobias. De
um pedido passei a uma ordem e assim rapidamente passei de novo a ser eu que
tenho a sessão controlada.