Vi que ele não andava bem e resolvi
fazer outra consulta com o Tobias, marquei para fora da sua casota para não ser
no seu território e fomos para o sofá, o meu território. O Tobias apareceu-me, assim
como se vai as consultas, na consulta, triste, cabisbaixo, demorou até começar
a falar e eu esperei em silêncio terapêutico convidando ao profundo pensamento
e ele entre excitações lá foi dizendo: - ( que não tem namorada e pensa que se
fosse um Rottweiler seria mais fácil. Seria mais fácil ser desejado, com menos
esforço chegaria lá e que ouviu dizer, por aí, nos livros e na TV, que as
pessoas podem ter ego e sentir orgulho. Eu perguntei-lhe depois de um silêncio,
mas o que é que te impede? De quê, perguntou-me ele, num ar longe com os
pensamentos voando em imagens por ele imaginadas de tudo e de nada. Há, tenho
medo! Medo? Questionei eu, medo de quê? Então ele com calma foi dizendo, que: -
Não sei! Mas lembro-me de uma vez, ler o “Principezinho” e fiquei com medo, nem
dormi durante alguns dias, perturbado com a sua solidão e com a sua procura, à
procura de um amigo. Que cruel foi aquele Saint Exupéry. Bem, aqui fiquei mais
preocupado, pois pensei, não sei se hei-de de aplicar-lhe algum método
quantitativo ou se vou ao cinema com ele, ver o “Alice no País das Maravilhas”
do Tim B. para ele poder ter identificação e não se sentir tão sozinho, mas no
cinema ainda me sinto mais só disse num latido triste, o meu Tobias. E
continuou, falta-me qualquer coisa que me dê prazer, assim forte, potente, ouvi
falar de sexo e não conheço, sou virgem e tenho vergonha, disse baixinho, mas
depois aumentando o tom reforçou, que: - mas aos cães lá da rua, vou à janela e
ladro muito, como eles, para me fazer notar e eles assim pensam que eu já tive
muitas, “experiências” e que sou difícil e forte como um rottweiler. Pensei em ir-lhe
buscar um espelho, para ele se ver, mas podia-lhe criar uma falha narcísica e
Orkut zangar-se-ia comigo dizendo que: -
Essa fenda! não é para entrar, escolhe pré-Contemplação. Bem como estamos em consulta de forma holística,
vou tentar entendê-lo, com empatia, viajando com ele, vou ser ele sem deixar de
ser eu. É como se esta angústia de ter que ter prazer e sexualidade fosse
comandada pelos meus genes, como disse o R. Dawkins, os memes, e que
antecipando o perigo de não deixar descendentes eu vá sofrendo de angústia por
oposição ao prazer que devia sentir, não sou livre, custa-me a respirar, doí-me
o peito se calhar vou antes ao médico. Sobre a angústia da decisão. Do problema
da angústia ser determinado pela antecipação de um perigo como o sentimento de
ausência de defesas ou o fracasso da razão. Aqui vi-lhe uma lágrima e lembrei-me
do Pathos, Logos e Ethos, fugi para não sentir pois não me posso emocionar quando
estou em consulta tenho que ser “rottweiler” mas sereno. Passei o assunto para
mim, tomei-lhe o leme e dei-lhe um rumo e resolvi falar-lhe dá angústia de
Freud e de Kierkegaard e disse-me que já tinha lido isso tudo e que não o fazia
sentir melhor. Disse-me que já foi religioso e existencialista, mas que não
pode fugir dele. Já tinham passado mais ou menos 52 minutos no relógio de
parede que eu observava sem que ele notasse para não ficar comprometida a nossa
relação, pelo tempo e num tom calmo e amigável disse-lhe bem por hoje chegamos
a fim e vamos marcar uma próxima consulta. Tu é que sabes, levas-me a rua?
Claro, anda!
Álvaro Carvalho, 10 de Novembro de 2011.
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