domingo, 27 de novembro de 2011

Temos que voltar as consultas o mais depressa possível pois tu estás impossível.


O Tobias falou-me que era muito mais difícil estarmos sozinhos de que estarmos com os outros, pois havendo outros, podemos nos apoiar ou termos algo para comparação, sozinhos contamos apenas connosco, com as nossas referências e aprendizagem e estamos mais expostos. Lá vem ele justificar o seu isolamento pensei eu, de mim para mim. Foi aquilo de que eu te falei, de ter ficado com problemas, depois de ter lido «O Principezinho», fez-me confusão aquela solidão, aquele menino sozinho com adultos, procurando respostas para o seu crescimento, para a compreensão, não querendo ser um Peter Pan, mas deixa-me angústia por haver tamanha solidão. Se estes são os livros recomendados, então estamos mesmo sozinhos ou trocados. Isso, clamei eu, foi a tua interpretação da história, porque há quem diga que o significado do livro está na relação que ele tem com a rosa, e que de tanto a querer proteger acaba por prendê-la, o que é igual a tirar a vida. Oh, isso é fácil pois ninguém é de ninguém e é tudo uma questão de posse, se leres Siddhartha compreendes que a solução está na via do meio. Eu acho que não é nada disso, penso que o Saint Exupéry estava a falar da sua solidão, e que criou um amigo imaginário com quem falava. Muitos foram agrilhoados por causa disso, chama-se ouvir vozes, outros tomam medicação. Ninguém é livre. Tu próprio me obrigas a ir para a casota quando há visitas cá em casa. Não deixas ninguém sossegado, disse-lhe eu, queres as atenções todas para ti. Não é verdade, isso é a tua verdade, isso é quando tu não queres ser incomodado, não vejo diferença nenhuma, entre o que me fazes e a flor do Principezinho. O quê? É um ingrato este Tobias, não o devia deixar ler coisas tão complicadas pois fica logo introspectivo e questiona o que tantos adoram. Por muito menos G. Bruno foi queimado na fogueira. Os tempos mudaram, somos todos mais tolerantes, mais conscientes. Esta consciência universal dá-nos para ser altruístas e misecordiosos em vez de sermos objectivos e práticos pois só quando há um apelo a massificação é que nos movemos timidamente numa preocupação para com o outro, a sua fome. A solidariedade aparece como catarse ao remorso. Há quem chame a isso o triângulo da auto-obsessão, mais uma tríade ou tripartirdes do inconsciente purgatório religioso que excomunga o nosso inferno, o de Dante e da Inquisição. Não percebi, porque este fim-de-semana vi crianças a pedir  esmola, as crianças não deviam ser enganados neste mercado, deviam responsabilizar os adultos por ser preciso pedir para a Fome. Falamos de valores, que educamos num humanismo, quando na realidade o racionalismo mercantilista se desenvolve cada vez mais. Estás crianças sabem o que estão a fazer? Sabem que somos nós os responsáveis por tudo isto. Vão de carro e com as suas melhores roupas ou vestidos de escuteiros para os peditórios nacionais as portas dos supermercados, que claro vendem mais, nesses dias em nome de uma causa. O Banco Alimentar não dá ajuda directa, portanto se tiveres fome vais para a fila porque não se pode confiar no homem, que diz ter fome é que pode ser para vender ou trocar. Como, perguntou o Tobias o homem não confia no outro? Porquê essa admiração, o homem é isso. Então percebo porque é que o Principezinho andava só, ele não se sentia só, só precisava era de um amigo em quem confiar e a protecção a rosa, era porque precisava que confiassem nele, tão simples, tão elementar, como é que eu não via. Então essas crianças pensam e sentem-se melhor porque nesse dia estão a pedir é como se estivessem a desculpar-se e os adultos que as motivam para este comportamento resolvem assim as suas culpas. Andamos sempre a pagar os erros? Quais erros? Tu cometes-te algum erro? Sei-lá, mas parece, pois quando vou para a casota, é então porquê? Porque sim, porque é sinal de boa educação e de seres um bom cãozinho. Devo então obedecer as regras e normas, ser prático e funcional, como uma máquina, não era isso que o Roger Waters, dizia no «The Wall»? Que tudo faz sentido! Enquanto, F. Pessoa se referia ao: «que o sentido que isto tudo tem é não ter sentido nenhum». Tu não te tens de preocupar com isso, pois ladras e eu dou-te água e ração e depois umas festas e podes dormir descansado. O Tobias olhou-me nos olhos e surpreendido disse mas isso é algum privilégio, sou algum Rei ou egoísta, sou por acaso diferente, isso não é ao que todos temos direito. Tobias não sejas ingénuo, Incrível esta inocência, esta Utopia. Não é Utopia, como pode ser uma Utopia o que devia ser um bem comum, aqui Utopia parece-me mais uma grande preguiça de alma do que outra coisa. Então o homem é isso, por isso o principezinho viajava nos sonhos para não se sentir sozinho.
Tobias anda, vamos a rua, está na hora e temos que voltar as consultas o mais depressa possível pois tu estás impossível.

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